É de imprescindível importância, antes de entrarmos em contato direto com o filme analisado, que executemos um breve relato sobre o empreendedor de tal obra, o cineasta, diretor e acima de tudo gênio Charles Chaplin, com o perdão da inclusão da minha humilde opinião. Primeiramente, o que venho a constatar é que a analise de qualquer película criada por Charles Chaplin sempre por mim será feita de forma apreciativa, haja vista que tenho uma grande admiração por esta pessoa, mas que sem duvidas tentarei ser o mais objetivo e imparcial possível, tendo em vista que a imparcialidade é utopia, e tendo em conta que a genialidade e a apreciação geral das obras chaplianas independem dos meus elogios e das possíveis criticas, que inexistem e não tenho capacidade a fazê-las, sobre suas obras.
Nascido em 16 de abril de 1889 em Londres e tendo como falecimento a data 25 de dezembro de 1977, Charles Chaplin, ou Charlie como era costumeiramente chamado, teve em seus 88 anos de vida uma intensidade artística que seria até um pleonasmo enumerar neste exato momento. Algumas de suas obras mais conhecidas, por exemplo, são: “O garoto”, “O Grande ditador”, e “Tempos modernos”, para não citar outras tantas. Nestes anos de vida, de infância sofrida ao estrelato, encarou varias imposições, obstáculos, como a doença de sua mãe, as dificuldades econômicas em sua infância e acima de tudo a sua proibição de frequentar os Estados Unidos por ser considerado um sujeito subversivo, um suposto comunista pelas autoridades americanas, tendo que exilar-se na Suíça, somente sendo novamente recebido nos EUA nos seus momentos finais de vida quando recebeu um premio de honra da academia americana de filmes, um reconhecimento tardio e digo até oriundo de arrependimentos por tal exílio. Enfim, foi um sujeito de personalidade forte e marcante, cuja presença de pensamento persiste até os dias atuais, caso contrario não seria tido como um dos Magnum-opus do cinema, e da humanidade, considero eu por sua extrema inteligência, força e coragem.
Bom, vamos ao que interessa: O Filme “Tempos Modernos”. Rodado em 1936, o filme ambienta-se numa nova organização social oriunda da maciça industrialização em que se encontrava o mundo. É necessário entender que o filme é locado nos Estados Unidos que vivia um período conturbadíssimo oriundo da crise da bolsa de valores em 1929 e o país ainda buscava soluções para esta crise que causou desempregos, miséria, suicídios e etc. Charlie Chaplin assim buscou entender e ler o meio em que estava ambientado, e na sua obra soube retratar com sagacidade a realidade em que vivia o mundo pós-crise e acima de tudo espelho da força industrial. É neste contexto que vai girar toda a história central do filme.
Inicialmente nos deparamos com uma ampla visão do mundo novo enraizado na cidade de Nova York, com a acelerada industrialização e a consequente e desenfreada urbanização, fenômenos que feitos de forma intensa e egoísta acabam não respondendo a altura a respostas necessárias a vida de todos, ocasionando miséria, desempregos, marginalidade, e outros tantos problemas ocasionados por tal insano processo.
Assim, Carlitos, é logo retratado em ambiente fabril, em suas atividades habituais de proletário. Interessante ressaltar que nos momentos iniciais do filme retratam-se com bastante ironia, mas sempre com muita fidelidade e coerência algumas características marcantes das indústrias, como a eterna fiscalização por parte do empresário em relação aos seus empregados, como percebemos nas hilárias cenas em que os proletários estão desempenhando suas tarefas e repentinamente por meio de um telão o seu chefe aparece para lhe repreender ou para dar uma ordem urgente. Mostra-se toda a estrutura fabril, maquinários, sistema de montagem e categorização de funções.
É neste contexto que nosso Carlitos aparece. É um simplório proletário que desempenhando a sua função de apertador de porcas acaba ganhando um tique nervoso que o acaba levando a problemas e momentos de constrangimento, haja vista a cena memorável quando Carlitos em um momento de torpor acaba entrando no interior de um maquinário causando um susto nos seus colegas de trabalho, porem voltando ileso deste momento, mas desde já mostrando os perigos que o proletariado sofria com a falta de proteção em suas tarefas. Desta forma, é retratada a “contemporânea” divisão social do trabalho, onde cada qual desempenha a sua função exclusiva não fugindo de forma alguma desta. Fato é que relatado tais processos do trabalho, conjecturo se em tais indústrias a divisão social do trabalho acaba por levar a uma maior especialização do individuo, no tocante ao mais complexo significado do termo, se esta nova forma de agir o leva a melhorar, a crescer, ou acaba tornando-o como a uma simples engrenagem de todo um complexo. O Sociólogo Emile Durkheim explica com clareza que com a divisão do trabalho os seres passam a ter uma solidariedade regida pela interdependência econômica e que agora cada um tem a chance de desenvolver mais seu individualismo e entender a importância do outro ser ao teu lado e etc.
Concordo, de fato é assim, porem refleti por algum tempo buscando enxergar se nesses complexos fabris, onde o ser humano é reduzido a um botão on/off, onde apenas aperta uma tecla, afrouxa um parafuso, enfim, se em tais locais ele se vê possibilitado de desenvolver tal individualismo, de fortalecer a sua personalidade, de crescer dentro de suas tarefas e principalmente de criar amor a sua tarefa, sua função.
Bom, de fato, na sociedade contemporânea nas atividades liberais é evidente uma maior especialização e capacitação de qualidade, de escolhas, do “eu sou o que faço porque a escolhi e me aperfeiçoou dentro da minha vontade” levando a um maior individualismo de tarefas, enfim de um encaixe mais direto na sociedade, com raras exceções é claro. Mas não era esta a realidade do mundo nos anos 30, pós-crise, onde Carlitos era um proletário até por não compreender ou por obter chances de buscar entender se tinha como desempenhar outra tarefa na sociedade, até por que parar para pensar custaria até o tempo de cair na miséria, assim era mais pratico entrar numa indústria, virar um proletário e seguir o sistema. E Carlitos era esmagado pelo sistema. Como todos eram.
Carlitos desempenha a sua tarefa, tem sua vida social limitadíssima, e acaba sempre estando em apuros. É entendido como um comunista e é logo preso em uma cena de extrema inteligência na criação e na colocação da bandeirola, e por durante toda obra percorre vários empregos, sendo preso também por todos os momentos em que se coloca em alguma “confusão” ou mal entendido. Na prisão, alias, é de extrema importância relatar uma acida e realística critica de Chaplin em um momento de conversa quando Carlitos estava por ser libertado e pede ao guarda da prisão que o deixe permanecer, pois “Me sinto tão bem aqui”, e o guarda o responde com um simplório sorriso. Acaba por ser uma resposta ao mundo contemporâneo feito por ele, à selvageria do dia-a-dia, a correria do mundo moderno, onde é preferível estar numa cela de cadeia onde se pode permanecer 30 minutos ou mais sentado lendo algum livro, com seu prato de comida garantido nas refeições, com alguma qualidade e acima de tudo segurança, do que estar entregue as mazelas da vida que o mundo afora lhe pisa na cara e lhe responsabiliza pela sobrevivência.
De igual maneira é retratada paralelamente a vida de Carlitos, a historia de uma moça órfã que vive nas ruas, vitima do desenfreado “desenvolvimento” mundial, que acaba por cometer delitos em nome da miséria, como é reforçada na cena em que Carlitos é levado em prisão por estar justamente no momento que esta moça furta um pão com destino a sua alimentação. Carlitos se choca com ela, o guarda intercepta os dois, e este é levado em mais um mal entendido. A partir daí desenvolve-se uma relação de amizade fortíssima, de companheirismo, e acima de tudo de compreensão de duas pessoas que vivem praticamente as mesmas dificuldades e almejam os mesmos sonhos utópicos em suas vidas. Momento único, contudo acontece em um instante na qual Carlitos esta descansando com a moça em um jardim de uma bela casa e passa a imaginar uma possível vida conjugal com esta dentro de tal casa, quando é repentinamente interrompido por um guarda que toma conta das casas, possivelmente dos grã-finos industriais. São muitos os momentos vividos conjuntamente pelos dois, como o momento em que se divertem cantando e dançando em mais uma confusão na qual Carlitos se encontra.
Enfim, é uma obra em que poderia me alongar se tivesse capacidade para tal, e abordar outras instancias, cabendo este breve texto mais para uma resenha ou para uma opinião pessoal, porem redijo aqui as informações que achei necessárias por mencionar em minha analise sobre a obra que é um marco no cinema. “Tempos Modernos” nos ajuda a entender a realidade não somente de uma época, como também as consequências trazidas para a nossa atualidade, seus efeitos, transformações, tendo em vista que os dias de hoje são frutos do passado e se optarmos por enxergar que "O tempo não existe, é apenas uma convenção social” (Jorge Luiz Borges) este passado não mais existirá e assim nós vivemos num mesmo tempo, num mesmo presente, é claro, um presente diferenciado em relação ao anterior, mais que não foge muito no que se refere à intensidade de desigualdades e na velocidade de transformações que sempre será uma característica marcante quando se existir atividade humana envolvida.
Ass: Rafael Costa Prata
Graduando em História Licenciatura pela Universidade Federal de Sergipe.
Textos muito bons. parabéns Rafael
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