Confesso que nutro certo preconceito
frente aos chamados “remakes” de clássicos do Cinema. Muito deste preconceito,
se é que pode ser justificado, se dá por conta de muitas refilmagens que pouco acrescentavam
– tecnicamente e mais ainda no aprofundamento da temática - frente ao que já havia
sido produzido anteriormente, aproveitando-se apenas do sucesso da franquia em
questão, para obter mais dividendos.
Entretanto, obviamente que muitos são
os casos de exceção. Neste sentido, surpreendeu-me bastante a produção da
película “Planeta dos Macacos: A Origem” (2011), pois, se tratando de um remake
de uma franquia de enorme sucesso dos anos 1960 e 1970 (quando se produziu
cinco filmes sobre a questão, e uma serie televisiva de enorme sucesso), surge àquela
dúvida: Qual inovação temática pode ser oferecida por esta película?! Há algo
mais a acrescentar? Estaremos diante de mais um “reboot” mercadológico desnecessário?
Grandíssima surpresa foi então a
minha percepção sobre o conteúdo apresentado por este remake dirigido por um
até então desconhecido diretor de nome Rupert Wyatt. A Película apresenta nos
100 minutos de sua exibição, um fortíssimo conteúdo de caráter contestatório,
calcado em um posicionamento politico de base ambientalista. Isto porque, as
principais criticas empreendidas pelo filme, são feitas sobre o Capitalismo e
suas vilanias, e noutro ponto, numa raiz central, as barbáries cometidas pelos
seres humanos frente aos animais. E são críticas bem incisivas e muito bem
fundamentadas.
Levemente inspirado no clássico
literário homônimo, de autoria do escritor francês Pierre Boulle, a película inova
ao reciclar esta história já bem ambientada no Cinema, trazendo novos
caracteres atualíssimos ao filme, em especial, como dito, questões que se
referem ao tratamento dos animais, e em um âmago mais profundo, a falta de
percepção humana sobre os seus próprios métodos, sua ligação com tudo àquilo
que compõe seu ecossistema.
O Filme conta a história de um
cientista, interpretado por James Franco, que procura desenvolver uma cura para
o Mal de Alzheimer, motivado pela degeneração a que passa seu próprio pai. Portanto, na empresa em que trabalha, os
testes genéticos são feitos sobre chipanzés. Após uma serie de testes em uma
símia de nome “Olhos Brilhantes”, a empresa considera que a droga pode ser um
risco aos humanos, procedendo então a uma matança indiscriminada dos chipanzés
que estão ali para testarem os produtos. Apenas sobrevive, um pequeno símio,
filho desta macaca de nome “Olhos Brilhantes” ,que é resgatado pelo cientista,
e criado em sua casa até os oito anos de idade.
Com uma inteligência absurda, logo se
vê que os experimentos feitos sobre sua mãe surtem efeito hereditariamente
neste. Cesar cresce nutrindo um forte amor pelo seu dono, a quem considera um
pai, sendo criado como uma criança. Enfim, o filme se segue, e daí em diante,
encontramos a reviravolta do filme que nos direciona a todas as questões
polemizadas pelo mesmo.
Ao demonstrar o doce e carinhoso
Cesar transformado em um desiludido macaco por conta das atrocidades que
percebe contra seus iguais no decorrer de sua breve vida, o filme nos leva a
pensar até que ponto somos nós os vilões desta história. Na verdade, é este o
ponto que guia toda a trajetória do filme: a certeza que somos nós os culpados
por tudo.
Torna-se praticamente impossível não “torcer”
pelos macacos em seus objetivos, na medida em que, o filme apresenta todas as
justificativas para tal – a descrição dos abusos sofridos, os descasos nos
testes com os animais, etc. - , criando uma triste e acachapante situação de
desconforto em nós – o público -, pois teoricamente estaríamos torcendo contra
a nossa espécie.
Quando os macacos começam a
demonstrar sentimentos e características biológicas – como consciência de vida,
habilidades motoras como a fala – passamos a acreditar que encontramos o tão
desejado elo perdido que nos leva até a diferença entre as espécies: os humanos
aprenderam a arte do mal.
Por mais maniqueísta que possa
aparentar esta visão, este é o motor certo da história. Comprovamos isso a
partir da própria atuação do líder símio, o macaco Cesar. Em nenhum momento
este ordena a aniquilação da raça humana, não profere insultos a nós. Muito
pelo contrário, quando este empreende a sua luta, muitos são os gritos de “Não”
para seus comandados, para que aqueles não atinjam aos civis, as pessoas, os
soldados, etc. Eles são fortes, possuem uma musculatura privilegiadíssima,
possuem motivos para fazer o mal – a vingança – mas assim não o fazem. Por quê?!
É a bondade, a pureza, e a simples
vontade de retornar as suas “casas” que guiam os macacos em todo o filme.
Quando os símios conseguem irromper a horda de policiais altamente armados,
conseguindo atingir uma floresta bem afastada de Nova York, o cientista ao
encontrar Cesar nesta floresta, ouve da boca do mesmo esta própria questão:
Cesar está em casa.
É o reencontro tão sonhado daqueles
com seu habitat natural, a natureza com suas arvores e troncos, muito longe das
jaulas dos laboratórios e das macas onde repousam nas horas de experimentos. Desta
feita, a liderança e a Ideologia pacifista frente aos humanos e libertadora
frente aos seus irmãos, de Cesar, empreende a uma forte crítica ao capitalismo,
que é de forma subliminar, apontado como a raiz de todos estes problemas.
Cesar ao proibir a matança
indiscriminada de civis, soldados, pessoas que aparentemente não possuem culpa por
tudo isto – mas de outro modo, são beneficiados de forma indireta por tudo
aquilo que é feito – demonstra uma justiça quase que utópica. Eles são justos
acima de tudo. Não querem nada mais que a liberdade. A Vingança, o ódio somente
é direcionado aqueles que tanto fizeram mal, de forma direta, aos símios. Uma
cena é paradigmática neste sentido: É o dono da grande corporação genética que
acaba morrendo, ao confrontar um velho macaco, marcado por anos e anos de experiências
sofridas, a que este mesmo empresário definiria como “alguém que sabe como
demais se comportar nas macas de experimentos”. O Macaco não o mata
violentamente. Apenas não presta ajuda, quando este está por cair em um precipício.
De certa maneira, podemos até, de
forma ousada, acreditar que a película se aproxima – ainda que de forma bem
leve – de uma visão marxista. Ao possuir em si, o germe de sua própria destruição,
o Capitalismo – simbolizado na indústria genética – produziu os meios – a inteligência
que impulsiona a libertação símia – para conferir a liberdade de seu proletariados
– os símios, alvos dos experimentos; importantíssimos para a maximização dos
lucros da empresa -.
Aqui não há futurismo, não há uma
amanhã dominado por macacos. Há só um Presente real e cru: a dominação dos símios
pelos humanos. Não há um “planeta dos macacos”. Há uma vontade inata de apenas
atravessar uma ponte que separa Nova York de uma floresta que desejam retornar,
para se livrarem de tudo aquilo. É esta a conjuntura apresentada pelo filme.
Ainda neste mesmo bojo, a película também
empreende a outra grande polêmica: Até que ponto deve ser permitida estas experiências
genéticas? Quais são ou deveriam ser os limites das mesmas? Até que ponto os
animais devem pagar por algo que visa o beneficio da raça humana?!
Obviamente isto tudo é muito polêmico,
pois não podemos negar que, boa parte dos medicamentos e cirurgias que
permitiram aumentar a melhoria de vida da raça humana perpassa por questões do
tipo. Temos visto hoje em dia, uma gama de discussões acerca justamente destas
questões. O Abuso acometido sobre os animais no que tange não somente, em
alguns casos, a experimentos feitos de forma violenta, e até em questões mais supérfluas,
como o uso de roupas de pele por companhias de moda.
Enfim, é por essas e outras questões,
que o remake produzido traz consigo algumas boas e coerentes reflexões. Ao
pensar sobre a “descartabilidade” dos animais nestes experimentos, calcada por
uma atitude humana, que certamente vela uma atitude que em alguns casos beira a
barbárie, o filme nos faz refletir sobre os próprios rumos da humanidade. Será
que o ser humano pensa em si mesmo? Ou pensa somente no vil metal?! Na
película, a cura para a Alzheimer é apenas um pretexto para a maximização dos
lucros da empresa biogenética.
Há de se pensar então, quem é humano
e quem é animal neste mundo.
Ass.: Rafael Costa Prata
Graduando em História pela
Universidade Federal de Sergipe
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