Poucos cineastas conseguem se apropriar do
Passado de uma forma tão inteligente e poética como Woody Allen. Não é de agora
que este aclamadíssimo cineasta se apropria de fatos, eventos e personagens de
nosso passado para dar corpo as suas películas. Em “Zelig” (1983), o cineasta “brinca”
com fatos do passado ao contar a historia de um descontrolado e sem identidade
homem de nome homônimo ao titulo do filme, que se vê passando por inúmeros
eventos de nossa história, influenciando a tudo e a todos.
O
Efeito de realidade que insere Zelig nos mais inimagináveis eventos históricos possíveis
seria consagrado praticamente dez anos após este filme, com o sucesso de
público “Forrest Gump: o contador de histórias” (1994), na qual seu diretor,
Robert Zemeckis, se utiliza do mesmo instrumento, para contar a história da sociedade
norte – americana pelo ponto de vista da personagem de Gump.
Mas
é com “Meia Noite em Paris” que Woody Allen atinge seu ponto máximo no que
tange a esse jogo entre ficção, realidade e história. O grande charme e ponto
alto da película é justamente o modo como o romântico cineasta se transpõe,
praticamente se metafigura – característica de quase todos os seus filmes – na personagem
Gil, interpretado por Owen Wilson, para discutir a chamada “Síndrome da Era do
Ouro”, uma faculdade, ou melhor, um defeito comum aos seres humanos seja qual
for à época.
E
o principio dessa “síndrome” é a nostalgia por aquilo que não se viveu, mas se
queria viver, ou seja, a História que foge das nossas mãos. O Cineasta procura
assim discutir a limitação humana em se satisfazer com seu presente em curso,
refletindo justamente sobre como os seres humanos, seja qual for à época, será,
como diria aquele outro, “um eterno insatisfeito”.
Nas
palavras do próprio Allen em forma de Gil (Owen Wilson): O
presente é isso mesmo. É insatisfatório. Porque a vida é insatisfatória.
Aliás, a interpretação do fenômeno também é dada por um curioso
personagem do filme, um pseudo-intelectual.
Este afirma que: Nostalgia é negação. Negação do presente penoso
(...) a noção de que uma outra época é melhor que aquela em que vivemos é uma
falha na imaginação romântica daqueles que têm dificuldade em lidar com o
presente.
É
partindo desta questão que o cineasta vai procurar demonstrar que o ser humano
não conseguirá encontrar a felicidade nem quando atingir sua utopia, sua era de
ouro. A inconstância, a desilusão, e a incapacidade de ser feliz por completo,
por ser uma capacidade de todos os seres humanos, acabar por impedir a
concretude de uma felicidade plena, coletiva.
Isso
é tão fato para Woody Allen que, quando a personagem Gil magicamente retorna a
Paris dos anos 1920, sua era de ouro, local onde habitam pessoas como
S.Fritzgerald, Hemingway, Picasso e outros, não consegue concretizar o seu amor
pela jovem cortesã pela qual se apaixona, pois esta irrompe para aquilo que é a
sua era de ouro, a Paris oitocentista, ou seja, a Paris antes de chegar ao
século XX.
Não
há, portanto uma era de ouro. Existem várias eras, individuais; cada um por
tentar corresponder, pelo artificio do sonho e da fantasia, os anseios do vazio
humano.
Enquanto
que Gil está plenamente feliz naquela Paris sonhada dos anos 1920, a jovem
Adriana, nascida naquele momento, só deseja retornar a Paris de 1890 para ali
ser feliz. Desencontram-se, portanto.
Ao
fim de tudo, a mensagem que Allen quer nos passar é que o ser humano deve
tentar ser feliz da melhor forma possível onde ele sempre vai estar: no seu presente
em curso, com suas limitações.
O
ser humano, avido pela nostalgia do que passou e foi bom, e até do que não
passou, mas que acredita ter sido bom, vai sempre se segurar no Passado, nos
eventos apresentados pela História, para buscar um refugio, a imagem de um
tempo perfeito que não volta mais, para se sentir mais infeliz ou limitado em
sua contemporaneidade.
Ass: Rafael Costa Prata
Graduando em História pela Universidade Federal
de Sergipe
Muito bom, adoro esse filme.
ResponderExcluir