sábado, 30 de novembro de 2013

“O Despertar dos mortos” (1978): uma sútil critica ao consumismo "black friday" de cada dia...

George Romero é talvez o maior cineasta do gênero terror de todos os tempos. Entretanto, é pouco reverenciado. Em uma outra postagem, demonstrei como este ousado diretor, através da película “A Noite dos mortos vivos” (1968), demonstrou e combateu a segregação racial que era uma tônica constante na sociedade norte – americana. Uma crítica forte e substancial em um filme de terror, gênero que, na maioria dos casos, é costumeiramente desprovido de qualquer consciência social.

Passados dez anos da produção de seu primeiro filme, George Romero retorna com mais uma película em torno dos famigerados “mortos vivos”. Desta vez, a película que se chamaria O Despertar dos Mortos”, de forma velada, entre muitas questões, faria uma sutil critica ao exagero, ao consumismo exacerbado de nossa sociedade.
A película que se passa em um shooping tem então um argumento claro e incisivo: de imediato, os seres humanos que conseguem sobreviver, se refugiam em um shooping, algo que parece remontar a um lar, um local onde, mais que qualquer outro, se sentem naturalmente bem. De outro modo, naquele local fechado, conseguem, a despeito de todo o caos social externo, manter toda uma vida centrada no consumo de produtos industrializados e etc, aspectos que a todo momento são reproduzidos no filme.
No entanto, a critica de Romero talvez seja mais decisiva em alguns pontos; em dias de black Friday, ou de liquidição em massa, os zumbis seriamos nós. Nossa atitude consumista se assemelharia a conduta daqueles que, sedentos, correm atrás de seu alimento por puro instinto. No nosso caso, o instinto é o consumismo.
Quando os zumbis caminham sem rumo, subindo e descendo escadas rolantes, caminhando entre lojas, se esbarrando nos manequins, o paralelo que se traça é a própria situação do homem moderno, confinado no cada vez mais imediato consumismo predador. Será que não caminhamos sem rumo, sem proposta, como verdadeiros zumbis, muitas vezes no feitiço do consumismo?

 Há uma cena inclusive bastante engraçada nesse tom: o auto falante do shooping chega a anunciar uma liquidação em uma das lojas, e curiosamente, por algum instinto fortíssimo mantido, os zumbis caminham, em sua lentidão habitual, a caminho da loja onde a liquidação estaria ocorrendo. Chegando lá, os portões estão fechados, e os zumbis “se revoltam”, se esbarrando e jogando os corpos frente a seus portões. Seria o consumismo nosso instinto mais indestrutivel?
Enfim, por essas e outras questões, é que as películas produzidas por George Romero devem sempre ser vistas como portadoras de alguma crítica social. Seus filmes, do gênero terror, mais comumente em torno dos mortos vivos, conseguem assim levar a uma reflexão em torno de certos temas bastante atuais em nossa sociedade.

Ass: Rafael Costa Prata

Graduado em História pela Universidade Federal de Sergipe

domingo, 24 de novembro de 2013

“A Porta da Loucura” (1936): Quando Hollywood dá sua opinião sobre as drogas


         Se hoje em dia a temática em torno da legalização das drogas acarreta uma serie de polêmicas e opiniões contrárias, o que dirá a visão geral sobre as mesmas no nascer do século XX?!
Com certeza, no iniciar do século XX, a questão era ainda mais controversa; na verdade, o posicionamento era mais direto: a droga é um mal a ser extirpado da sociedade custe o que custar.
    
Nesse sentido, um dos filmes propagandisticos, ou melhor anti – propagandistico, mais significativos em torno da questão é o clássico “Reefer Madness” (1936) do diretor Louis Gasnier. A película, que em sua tradução seria “A Porta da Loucura”, em linhas gerais, acaba por demonstrar toda a mentalidade da época acerca dos efeitos das drogas , ou a ideia que se tinha de seus efeitos, em especial, da “marihuana” – a maconha – na sociedade norte americana.
      Logo, desde o principio o filme possui um propósito claro: demonstrar como as drogas são nocivas e destroem o lar norte - americano. Filho que se volta contra pai, filha que engravida, amigos que se matam... Tudo por conta do efeito devastador das drogas.
      O Filme que tem pouco mais de 1 hora tem um enredo simples: conta a história de um casal de traficantes que passa a enriquecer ao vender drogas a jovens americanos, os quais vão gradualmente se desviando dos preceitos básicos de uma vida em sociedade. O tempo curto da película se justifica pelo fato de ter sido pensado e patrocinado por uma Igreja para ser exibida nas escolas, nos cultos e em outros locais onde a presença de jovens fosse maciça.
        Em uma das passagens dos filmes, chega a se mencionar que:
“Um rapaz de 16 anos mata a família com um machado. Uma garota de 17 anos se deixa seduzir por cinco homens mais velhos ao mesmo tempo. Tudo isso por causa do uso de narcóticos. Pensou em crise de abstinência de crack, abuso de LSD ou overdose de ecstasy? Errou! É tudo culpa da maconha.”
   
Em todo o momento, o filme se segue procurando conceder um enquadramento profundo e incisivo no rosto dos personagens, demonstrando as suas faces calmas antes da inserção no mundo das drogas, e posteriormente a transformação para uma nova conduta sombrio oriundo da inserção naquele meio.
      De fato, o filme é bastante interessante para se compreender a mentalidade da época acerca da questão. Os exageros em torno dos efeitos produzidos pelas drogas nos ajudam a compreender entretanto o medo daqueles frente aos seus efeitos, e principalmente, a vontade que o seio norte – americano nutria de conseguir parar a chegada das drogas em suas portas.
         O Tema em questão, passados quase 80 anos da produção do filme, ainda mantêm a sua natureza controversa, de modo que, este filme de posicionamento visivelmente definido, não deixa, por outro lado, de manter a sua atualidade preservada diante dos debates de hoje em dia.

Ass: Rafael Costa Prata
Graduado em História pela Universidade Federal de Sergipe

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Alladin (1992): a polêmica em torno do preconceito frente aos muçulmanos na canção “Arabian Nights”




O que era para ser uma bela e simples canção de abertura para uma animação de futuro sucesso se tornou um grande e imediato “problema” para a Disney. Após sua exibição no Cinema, Alladin tornou-se um sucesso estrondoso. Esta animação que narra as aventuras do jovem ladrão, seu amor impossível pela princesa Jasmine, e o mágico gênio da lâmpada, custou 28 milhões de dólares arrecadou mais de 500 milhões em todo o mundo, para os cofres da Disney. Entretanto, o primeiro minuto de sua reprodução traria um grande problema a sua produtora.


Acontece que a animação se inicia com uma bela imagem de um deserto tendo como fundo musical a canção “Arabian Nights”. No seu estrofe inicial se observa os seguintes versos:



Venho de uma terra, de um lugar

Onde sempre se vê Uma caravana passar.

Vão cortar sua orelha

Pra mostrar pra você

Como é bárbaro o nosso lar
 


De imediato, percebeu-se o preconceito frente aos muçulmanos nestes versos. Como reação, o Comitê Árabe – Americano Antidiscriminação protestou exigindo que a Disney alterasse a canção. Pedido aceito. Os versos iniciais foram alterados para:


Oh, eu venho de uma terra, de um lugar

Onde sempre se vê Uma caravana passar.

É uma imensidão

Um calor e exaustão

Como é bárbaro o nosso lar.



Percebemos que na estrofe condenada, os muçulmanos são descritos com o hábito de cotidianamente arrancarem as orelhas dos outros e o sentido da palavra “bárbaro” denota algo selvagem. Entretanto, de forma curiosa, a mudança ocorrida, ou seja, a apresentação dos novos versos, fazem com que a mesma palavra – bárbaro – já passe a significa algo como “maravilhoso”.
Isso tudo não surpreende quando temos em vista que boa parte dos filmes americanos dos anos 1980 e 1990 (e ainda hoje) denotam um estereotipo bastante depreciativo em torno dos árabes, na maioria das vezes descritos como terroristas, os “inimigos outros” desse novo tempo. Antes russos, agora árabes.

Ass: Rafael Costa Prata
Graduado na Universidade Federal de Sergipe.

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Oscar Micheaux : o primeiro grande cineasta negro na luta contra o preconceito racial




 A primeira obra cinematográfica produzida pelo renomado cineasta afro – americano Spike Lee foi um pequeno curta metragem intitulado “The Answer” rodado no ano de 1980. Este curta com pouco mais de dez minutos se apresentava como uma resposta de Spike Lee a D.W.Griffith. Na verdade, o jovem cineasta de até então 23 anos,  procurou responder  ao clássico racista de Griffith, “O Nascimento de uma Nação” (1915).
Spike Lee “incomodou”. E continua a incomodar. Até hoje é considerado um dos cineastas mais “polêmicos” do mundo, rotulo que se deve em grande parte ao fato de que em suas películas procura sempre retratar o lado das minorias sociais e/ou o preconceito racial existente no seio norte – americano.
Se considerarmos Spike Lee um sujeito “ousado” porque nos anos 1980 levou a cabo películas sociais, o que diríamos do pouco conhecido Oscar Micheaux?!

Nascido em Metropollis, Illinois, em 1884, Oscar Micheaux é considerado o primeiro grande cineasta negro do mundo. Lá nos anos 1920, quando a segregação racial – e o preconceito prático sentido na pele por meio da violência da Klu Khux Klan -,  ainda era fortíssima nos Estados Unidos, Micheaux emerge destemidamente e de forma independente para defender e conferir voz aos negros americanos, por meio do Cinema.
Suas películas, que se enquadram no chamado racial films, se contrapunham a visão racista e caricata que os filmes de Griffith e outras mídias procuravam impregnar em torno do negro. Conferindo voz, atuação e papel aos atores negros – fugindo assim do horrendo artifício do blackface-, Mischeaux produziu uma serie de filmes que obviamente apresentaram um caracter underground frente a realidade da época.
Seu mais conhecido filme “Within our gates”(1920) se apresenta ainda hoje como um dos mais importantes relatos acerca do tratamento sofrido pelos negros americanos no nascer do século XX. De tão realista, o filme se torna bastante cru ao mostrar cenas de linchamento, ou qualquer outro tipo de violência efetuada pelos brancos sobre os negros. Este filme de quase 80 minutos surge de certa forma como uma resposta ao racismo assistido em “O Nascimento de uma nação” de Griffith, produzido cinco anos antes.
Nos demais filmes de sua carreira, Micheaux procurou retratar a vida do cidadão negro, retratando desde situações do dia a dia, até traços mais peculiares, como a cultura do jazz, tendo produzido mais de 30 películas, até que a morte rapidamente tenha lhe acometido em 1951, por conta de um problema no coração, morrendo então aos 67 anos de idade.

Passados quase oitenta anos de suas películas, fato é que Micheaux continua ainda pouco conhecido. Alguém de sua importância, de sua coragem e de seu talento precisa ser resgatado. Encarar de frente todos os preconceitos de uma época, se inserir em um nicho de “domínio branco”, foi uma das marcas deste grande cineasta político, deste grande homem a frente de seu tempo.
Assim, acredito eu que, quando Spike Lee resolveu iniciar sua carreira efetuando aquele curtinha de dez minutos, ele já tinha em mente que lá atrás, um grande homem negro já havia dado um enorme passo na luta pelo rompimento da segregação e do preconceito racial. Nenhum outro “incomodou” tanto quanto Oscar Micheaux.

Ass: Rafael Costa Prata
Graduado em História pela Universidade Federal de Sergipe









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