segunda-feira, 19 de novembro de 2018

“Infiltrado na Klan” (2018): uma poderosa comédia-dramática sobre a infiltração de um policial negro no coração da Ku Klux Klan.



Um genuíno “Spike Lee” na mais poderosa e furiosa essência. Um grande e eficaz soco de Mohammed Ali no estômago. Quero começar a minha breve consideração sobre a película “The BlackkKlansman”, aqui traduzido como “Infiltrado na Klan”, com estas expressões que seguramente exprimem a minha imediata sensação após o vislumbre dos 130 minutos do filme. Faz-se certo que eu não esperava outra coisa se não uma obra desta dimensão oriunda de sua mente pensante. Spike Lee sempre soube como ninguém tratar das inúmeras problemáticas – segregação racial, violência institucional, empoderamento e ativismo negro, etc - relativas à história afro-americana.



 1989. O ano da virada para Spike Lee. Apesar de ter produzido filmes anteriormente a esta data, fora com a direção de “Faça a coisa certa” que o seu nome saíra do anonimato. Contundente, esta comédia-dramática se tornara rapidamente um sucesso de crítica e de público ao problematizar o pungente clima de tensão racial existente nos bairros do Brooklyn, em Nova York. Nessa ocasião, Spike Lee concorrera ao Oscar de Melhor Roteiro Original e, inclusive, de Melhor Ator Coadjuvante por sua participação na película.



Com a aclamação de “Faça a Coisa certa”, Spike Lee não desviaria de seu propósito: continuar produzindo filmes que problematizem questões cruciais do cotidiano negro norte-americano. Não por menos em 1992, produzira e dirigira a cinebiografia de Malcom X, interpretado por Denzel Washington, igualmente agraciado pelo público e pela crítica.


Da segunda metade dos anos 1990 para os anos seguintes, Spike Lee passou a sofrer uma série de críticas por, supostamente, “ter perdido o seu enfoque social e político”, passando a produzir películas superficiais. Porém, a sua resposta chegaria no decorrer dos anos 2000, com o retorno de produções de películas profundas como “O Milagre de Santa Ana” (2008).
“Infiltrado na Klan” emerge na cinematografia de Spike Lee como o suprassumo deste renascimento; todas as características, as qualidades e os procedimentos que estruturam o cinema de autoria de Spike Lee, regressam com todo folego e força nesta película: sarcasmo, ironia, drama, trilha sonora escolhida a dedo, roteiro minucioso, enquadramentos sofisticados, fortíssima crítica política e social, etc.
A direção desta película lhe fora dada, a convite, por Jordan Peele, o emergente e aclamado diretor de “Corra” (2017), que enxergara em Spike Lee, o cineasta ideal para levar as telas do cinema, a história real de Ron Stallworth, um policial negro do Colorado, que conseguira se infiltrar na sede local da Ku Klux Klan por meio de conversas telefônicas com integrantes do grupo. Evidentemente que, por ser negro, o policial não se integrara pessoalmente no Klan, sendo então “substituído” por um amigo policial branco. Não falaremos mais do enredo, para não efetuar os famigerados spoilers.


Baseado então na obra Black Klansman, de autoria do próprio Ron Stallworth, Spike Lee levou as telas do Cinema, uma película inteiramente engajada, na qual se mesclam as doses certas de comédia e drama, sem se perder a real dimensão do que se estava sendo problematizado: a segregação racial, a violência, os conflitos.
Discutem-se não apenas a segregação racial, a violência nos meios urbanos e rurais por onde a KKK continua a agir, mas como também a violência institucional nos próprios locais onde a população afro-americana tentava e tenta se inserir. O policial Ron Stallworth se apresenta como um policial que sofre diariamente preconceito de seus próprios colegas de trabalho. “Policial neguinho, procura um ofício para mim!”. Ele, próprio, o único na central policial de Colorado.


Ademais, o filme ainda problematiza o papel sociopolítico dos movimentos de empoderamento negro, como os Panteras Negras, no decorrer dos anos 1970, demonstrando como o governo americano, inclusive, tratava de rotulá-los rapidamente como a “principal ameaça política interna”.


Não se trata de um filme apenas sobre o Ontem. Trata-se de uma película, infelizmente, atemporal. Spike Lee faz questão de reforçar esta questão em todos os minutos da película, sobretudo, com o final absurdamente triste, porém, necessário com que se encerrara a película. Os problemas estão longe de serem encerrados.



Um filme mais do que necessário. Incisivo. Pungente. Cortante. Uma comédia? Sim, em inúmeros momentos. Um Drama. Igualmente. Um perfeito quadro Spike Lee.

Ass. Rafael Prata.
Doutorando em História na Universidade Federal de Mato Grosso.




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