No último domingo, 22/03/2015, assistimos a mais um belo
duelo entre os dois principais clubes da Espanha: o Real Madrid e o Barcelona.
De um lado, a trupe sul americana de Messi, Neymar, Suarez e companhia, e do
outro, o esquadrão de Cristiano Ronaldo, Benzema, Gareth Bale, dentre tantas
outras estrelas que habitualmente engrandecem tal peleja. O Barcelona venceu
por 2x1, com 2 gols de Suarez, tendo Cristiano Ronaldo anotado o gol dos madrilenhos.
Mais do que um grande clássico, o duelo envolvendo
tais clubes comporta uma dimensão histórica e simbólica que ultrapassa os meros
limites das linhas do campo. As origens desta que é talvez a maior rivalidade
futebolística do planeta, pode – e deve – ser procurada também em um cenário
que não é o da bola, mas sim o da conjuntura política de uma nação no decurso
de sua trajetória histórica.
Em
outras palavras, a história política da Espanha no decorrer do século XX muitas
vezes se confunde com a história da formação e da intensificação da rivalidade
entre o Barça e o Real no decorrer de sua história. O Real Madrid, o clube da
capital, ainda hoje tende a ser visto como o clube da elite, da realeza,
agremiação esta que seria em muitos momentos intensamente auxiliada por forças
políticas, como ocorrera, em especial, nas ações do ditador Francisco Franco.
Já o Barça é tido como o clube da “dissidência”, é o símbolo da força e da
determinação do “povo catalão”, sempre disposto a bater de frente ao poder
centralizador das forças políticas espanholas quando necessário.
O Brasileiro Evaristo de Macedo atuou por ambos os clubes nos anos 1950/1960: no Barça(1957/1962) e no Real (1962/1965) |
Tal bipolaridade remete profundamente
aos atos políticos que marcariam a primeira metade do século XX espanhol,
quando estes acabavam influenciando também no cenário da bola. Acontece que
quando o generalíssimo Francisco Franco assume ao poder espanhol, este passará
a se utilizar do Real Madrid, seu clube de coração, como instrumento político,
patrocinando-o intensamente. O Real Madrid que obviamente já era muito grande
nas lides de 1940, se tornaria maior ainda, pois Franco passou a patrocinar a
contratação de todos aqueles jogadores que fossem considerados os melhores do
mundo no momento, atravessando inclusive as contratações que seriam do
interesse do Barcelona. Foi deste modo, por exemplo, que Francisco Franco teria
auxiliado na montagem daquele que é considerado o maior time da história do
Real Madrid, quando o time passou a contar com Di Stefano, Puskas, Gento, e
inclusive o brasileiro Didi, entre 1951-1960. Esta “seleção”acabou ganhando,
durante o período, 5 taça dos campeões da Europa (o equivalente a atual
Champions League) e 4 campeonatos espanhóis, praticamente dominando o cenário
futebolístico ibérico.
O Brasileiro Didi: contratação de peso do Real Madrid em 1959 |
A contratação do citado Di Stefano
revela, inclusive, a natureza das ligações entre Francisco Franco e o Real
Madrid, uma vez que o jogador estava praticamente acertado com o Barcelona, no
entanto, o ditador Franco acabou cobrindo a oferta, trazendo-o para o time
madrilenho, onde se tornaria o maior ídolo da história do clube.
Francisco Franco: um "patrocinador" do Real Madrid? |
E foi assim que a rivalidade entre ambos
os clubes foi se intensificando por conta de questões políticas. No Camp Nou, o estádio do Barcelona, quando os clássicos eram realizados naquele, a torcida
catalã aproveitava esse momento para vaiar intensamente ao general Franco,
cantando e xingando inclusive na língua catalã, que havia sido proibida pelo
mesmo Francisco Franco.
Ainda assim nos anos 1950, o Barcelona
conseguiu resistir ao poderio madrilenho, tendo obtido também, naquela década,
o número de 4 troféus da liga local. Mas os anos 1960/1970 seria devastador,
pois o Real Madrid ganharia 14 troféus dos 20 em disputa durante aquelas duas
décadas, enquanto que o Barcelona apenas 2. Tudo isso, consta-se, com a égide do generalíssimo
Franco. Há quem diga ainda que o Santiago Bernabeu, o estádio do Real Madrid, fundado
em 1947, também teria sido construído com o dinheiro dos cofres espanhóis, a
mando de Franco. O próprio Santiago Bernabeu, ex-jogador do clube e que passara
a nomear o estádio, havia lutado no exército de Franco durante a guerra civil
espanhola.
Não há duvidas que tal peleja coloca em jogo o maior
duelo futebolístico do mundo. Um duelo que vai muito além de questões da bola,
tendo sido “fortalecido” por questões históricas. O Real Madrid, o clube mais
rico do mundo, continua a ser uma grande potência, montando verdadeiros
esquadrões de “galáticos” ano após ano. O Barcelona, seu maior rival, após um
longo período de crise, ressurgiu com bastante força a partir de 2003,
tornando-se hoje, junto com o seu rival, a maior potência futebolística do
planeta.
Ass. Rafael Prata
Mestrando em História na Universidade
Federal de Sergipe.