quarta-feira, 24 de setembro de 2014

[Futebol e História] Francisco Carregal: o primeiro jogador negro do Brasil

Em tempos em que se tem discutido o racismo na sociedade brasileira, e também em todo o mundo, e sua “manifestação” dentro dos campos de futebol, quando uma série de jogadores tem sido alvo de horrendas manifestações racistas, como a ocorrida recentemente com o jogador Aranha, goleiro do Santos, por parte de uma torcedora gremista, convém destacar aquele que deve ter sobremaneira enfrentado com toda força, o peso de uma sociedade altamente racista: Francisco Carregal, o primeiro jogador negro do Brasil.
O Futebol, aos príncipios do século XX, era visto como “esporte de branco”, de uma elite aristocrática que passara a praticar o esporte importado por Charles Miller de terras britânicas. Assim, boa parte dos clubes amadores que passam a se formar, são compostos basicamente por homens brancos, filhos de uma elite, sendo praticamente vedada a participação de negros na composição dos times.
No entanto, consta-se que em 14 de maio de 1905, esse “tabu” foi quebrado, ao menos em uma partida. Foi quando o Fluminense, clube paradigmático da aristocracia carioca da época, enfrentou ao Bangu no jardim da Fábrica Bangu, tendo o primeiro vencido a partida por 5 a 3.

Francisco Carregal com a posse da bola

No meio dos jogadores do Bangu, estava o operário negro Francisco Carregal, atuando entre os brancos jogadores de ambos os times. O tecelão da Fábrica Bangu, se tornou, portanto, o primeiro jogador negro de nosso país.

Curiosamente, o Fluminense, o time adversário que protagonizou tal “quebra do tabu”, ficaria famoso posteriormente também por um caso envolvendo a um jogador negro, tendo inclusive obtido um certo apelido por conta do episódio. Tudo aconteceu em 1915, dez anos depois, quando o clube aristocrata aceitou em seu escrete a adesão de um jogador negro de nome Carlos Alberto. O jogador, em sua estreia, procurando “disfarçar” sua cor, por medo do preconceito, acabou se utilizando do artificio do “pó de arroz”, mas no decorrer do jogo, diante do suor, tudo se desmanchou, de modo que, a torcida adversária de imediato começou a gritar “pó de arroz”, expressão que de imediato viraria apelido da equipe.
Outro clube carioca, no entanto, ficaria famoso por conta de sua luta contra o preconceito: o Vasco da Gama. O Time da Colina foi o primeiro clube a se revoltar contra o preconceito existente no seio futebolístico, quando no ano de 1924, o Vasco, formado por uma grande quantidade de jogadores negros, foi alvo de uma tentativa de afastamento do campeonato carioca por ação dos demais clubes cariocas. Como reação, a equipe cruzmaltina publicou um manifesto direcionado a associação de atletas, apresentando seu repudio tanto ao preconceito quanto as tentativas de afastamento.

Os "desclassificados" seriam justamente os jogadores negros do elenco vascaino

Do começo do século XX para cá, a situação obviamente que mudou muito. No entanto, o racismo ainda é, infelizmente, uma parte presente da sociedade, não somente a brasileira, como também de outras nações do mundo. Uma chaga que se recusa a deixar de existir. No fundo, o Futebol se apresenta como mais um espelho da sociedade, que reflete todas as suas mazelas, seus preconceitos. Sonhemos com o dia em que não veremos mais essa triste série de acontecimentos envolvendo atletas, desde o aqueles ocorridos em nosso país – Aranha, Grafite, etc -, como também os ocorridos em solo europeu – Daniel Alves, Roberto Carlos, etc - , e que isso aconteça no âmbito geral de todas as sociedades, em outras palavras, lutemos para que o esperado dia em que o preconceito será extinguido, se torne cada vez mais próximo!
Ass. Rafael Prata
Mestrando em História na Universidade Federal de Sergipe 

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Um talento a serviço do mal: a cineasta Leni Riefenstahl (1902-2003) e os filmes de propaganda nazista


Nascida em Berlim no ano de 1902, a atriz e cineasta alemã Leni Riefenstahl, falecida desde 2003, imortalizou-se por conta de suas produções a serviço do regime nazista de Adolf Hitler. No entanto, mais do que uma mera cineasta “paga” pelo regime, Leni realmente se apresentava como uma cineasta de enorme talento, tendo revolucionado algumas das técnicas cinematográficas de então. Fora um verdadeiro talento a serviço do mal.
Conta-se que Leni, aos 30 anos de idade, tivera seu primeiro contato com Adolf Hitler, no ano de 1932, em um comício do partido nazista, quando a jovem teria ficado alucinada com o poder da oratória de Hitler. Quando o Partido Nazista assume o poder em 1933, Hitler então copta a jovem cineasta, que de imediato passa a trabalhar para o regime nazista em seus projetos de fortalecimento e legitimação por meio do Cinema.

Leni na companhia de Adolf Hitler

Leni produz e dirige seu primeiro documento no mesmo ano, chamado “A Vitória da Fé”, na qual reproduz o Quinto Congresso do Partido Nazista, com tomadas em foco da expressão do Fuhrer, numa espécie de ensaio para sua “grande obra” do ano seguinte. Assim foi então que em 1934, Leni lança sua “obra prima”, a película “O Triunfo da Vontade”, um documentário de quase duas horas de duração, cujas imagens impressionam pela natureza épica, pelas inovações no tipo da filmagem. Enfim, a obra não deixaria de ser um “louvor” a figura de Hitler e aos mecanismos do sistema nazista.

Cena de Triunfo da Vontade, de 1934.

Tal filme tornou-se o marco cinematográfico do regime nazista, servindo de modelo para outros regimes totalitários, como paradigma do potencial oferecido pelo Cinema na propagação de ideologias.
Leni, continuando sua “saga de louvor”, lança em 1935, a película “O Dia da liberdade: nossas forças armadas”, um curta de pouco mais de meia hora voltado a louvar as forças armadas alemãs, demonstrando seu dia a dia de treinamento, e reforçando sobretudo, o poder dos “arianos”. Em 1938, a documentárista lança um outro “clássico” de sua autoria, a película “Olympia”, na qual reproduz as cenas de suas filmagens dos Jogos Olímpicos de 1936, ambientados na Alemanha nazista.

Leni em seu processo de filmagem de Olympia, 1938.

Findada a guerra, Leni acabou sendo presa, quando ficou por 4 anos presta na França, e quando foi a julgamento, foi considerada apenas “simpatizante” do sistema. Em sua defesa, Leni costumava afirmar que era uma jovem ingênua e que desconhecia todos os fatos horrendos cometidos pelo regime durante a guerra.
No restante de sua vida, a cineasta procurou dar continuidade a sua carreira como cineasta, no entanto, não obteve  patrocínios obviamente por conta de seu passado, de modo que passou a desenvolver outras atividades próximas ao Cinema, como a Fotografia.
Em 2003, aos 101 anos de idade, Leni Riefenstahl falece em sua casa na Alemanha. Até hoje a sua imagem é de natureza extremamente ambígua: não há como negar seu enorme talento e suas contribuições para o Cinema, no entanto, deve-se pesar o destino de tal talento. Repito, um talento a serviço do mal.
  
Ass: Rafael Prata
Mestrando em História na Universidade Federal de Sergipe

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

[História e Futebol] Os anos 1940: quando a “Segunda Guerra Mundial” bombardeou a realização da Copa do Mundo

Um sucesso. Três grandes Copas do Mundo haviam se passado, e cada vez mais, o evento futebolístico orquestrado pelo francês Jules Rimet com o intuito de congraçar os mais importantes países praticantes do Futebol crescia em sucesso. Em sua primeira realização, no ano de 1930, no Uruguai, participaram 13 equipes, tendo sido campeã o país sede, o Uruguai, em final frente à Argentina.
O evento pensado para ser realizado de quatro em quatro anos, foi realizada na Itália, patrocinada pelo regime fascista de Benito Mussolini. Naquele ano de 1934, 16 equipes participaram, três a mais do que no evento anterior, e ao fim, a seleção sede também se tornou campeã, para delírio de Mussolini. O Terceiro lugar fora conquistado pela Alemanha nazista de Adolf Hitler, formada por jogadores de inúmeras nacionalidades.

Em casa, a seleção uruguaia se sagra a primeira grande campeã do mundo, em 1930

Em 1938, coube ao país natal de Jules Rimet, a França, sediar ao evento, “na beira” da eclosão da Segunda Guerra Mundial. 18 seleções participaram, e mais uma vez a seleção italiana sagrou-se campeã. O Brasil, grande surpresa dessa Copa do Mundo, conquistou a terceira colocação graças ao talento de Leônidas da Silva, o artilheiro e inventor do gol de bicicleta.

Leônidas da Silva, o grande craque da surpresa brasileira, em 1938.

Todavia, eclodida a Segunda Guerra Mundial, o evento acabou por ser interrompido. Obviamente, pois toda a geografia mundial passara a se concentrar na realização desse famigerado evento que culminou com a destruição de boa parte da Europa e um número incontável de mortos. Assim, a Copa do Mundo de 1942, que seria realizada no Brasil, não foi realizada, assim como também a Copa de 1946, a primeira por estar situada no meio do evento, e a última por conta da impossibilidade material de se pensar em um evento de grande escala durante o pensamento de reconstrução do pós-guerra.

Curiosamente, alguns jogadores brasileiros acabam sendo convocados para formarem o exército brasileiro nas fileiras da Segunda Guerra Mundial. Foi o caso de Perácio, meio-campista brasileiro na copa de 1938, que acabou sendo convocado, atuando em combate pela FEB, a Força Expedicionária Brasileira.
Até hoje alguns estudiosos do Futebol tem conjecturado os possíveis resultados caso as duas copas do mundo tivessem sido realizadas, naqueles anos de 1942 e 1946. Boa parte deles sustenta que a grande favorita ao titulo seria a Argentina, que despontava como a maior força do futebol sul-americano, ao ganhar a “Copa América” de 1941, 1945, 1946, 1947.  Há quem defenda, no entanto, que o país sede, o Brasil, que realizaria o ato apenas em 1950, também estaria na briga, pelo peso de ser o pais sede, como também pelo crescimento do futebol visto no país.
No entanto, não podemos negligenciar também o peso das grandes potências futebolísticas da época: o Uruguai e a Itália. A primeira seleção, o Uruguai, a essa altura, havia sido campeã da copa de 1930, de uma quantidade de “Copa América”, e seria, por fim, a campeã da copa de 1950 no Brasil. E a segunda, a seleção italiana, inegavelmente mostraria a força de uma seleção bicampeã do mundo, na defesa de seus títulos.

A bicampeã Itália (1934-1938) e sua recepção por Benito Mussolini

Tudo é claro, suposições. Exercício de imaginação. Nunca saberemos ao fim qual o resultado esportivo prático. O que se torna evidente é que a “Copa do Mundo”, ao nascer no principio do século XX, acabou por crescer num conturbado cenário político mundial, marcado por regimes totalitários, conflitos e guerras que deixaram a sua marca também na história do maior evento futebolístico.

Ass: Rafael Prata
Mestrando em História pela Universidade Federal de Sergipe

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Anne Frank (1929-1945) nas telas do Cinema: as representações do “Diário” na TV e no Cinema

Seu relato de vida é até hoje uma das “obras” mais lidas do mundo, passados quase setenta anos do ocorrido. Certamente “O Diário de Anne Frank” é um dos livros mais paradigmáticos para se compreender o terror da primeira metade do século século XX.
Anne Frank, uma jovem menina judia alemã, escreve entre 12 de junho de 1942 e 1 de agosto de 1944, a “história” da fuga de sua familia das tropas nazistas, para se refugiarem no sotão de uma residência em Amsterdam. Por lá, Anne procura passar o seu tempo escrevendo, contando as agonias de sua vida, seus pensamentos de menina em crescimento.
     O primeiro filme produzido sobre a jovem Anne, chegou as telas do Cinema no ano de 1959, quinze anos após a morte de Anne, quando o diretor norte – americano George Stevens produz então a sua versão sobre a vida da pequena Anne Frank, no filme homônimo ao título da obra, “O Diário de Anne Frank”. No papel da pequena Anne, está a jovem atriz Millie Perkins, que consegue cumprir com perfeição o papel de interpretar a inteligente menina.

Anne Frank, 1959, dir. Georges Steven

     O Filme, que levou três Oscars, retrata muito bem o terror da perseguição, os horrores do holocausto, e a agonia do confinamento da familia de Anne, que viveram por praticamente dois anos sem sair do sotão.
     Em 1969, o primeiro filme para televisão foi feito em torno da figura de Anne. “O Diario de Anne Frank, dirigido por Alex Segal, teve como interprete da menina, a atriz Diana Davilla.

Cena do filme televisivo, dirigido por Alex Segal em 1969.

     Alias, uma série de filmes e miniseries televisivas foram produzidas. Em 1980, o diretor Boris Sagal levou a TV, a sua versão da história, com a atriz Melissa Gilbert no papel de Anne Frank.  Em 1987, “O Diário de Anne Frank” ganha mais uma versão nas mãos do diretor Gareth Davies. No papel de Annie, estava a atriz Katharine Schlesinger. Em 1988, mais um filme televisivo: “O Sotão: o esconderijo de Anne Frank”, dirigido por John Erman, tendo a atriz Lisa Jacobs no papel de Anne.
     Em 1995, uma animação japonesa de grande qualidade é produzida sobre a vida da menina, dirigida por Akinori Nagaoka. Em 1999, a França apresenta sua versão sobre a história com outra animação, chamada “A jornada de Anne Frank”, dirigida por Julian Wolf.
     Em 2001,o “diário” ganha mais uma versão televisiva na película intitulada “Anne Frank: Toda a História”, dirigida por Robert Dornhelm. No papel da menina, a atriz Hannah Taylor-Gordon. Em 2009, mais um filme televisivo: “O Diario de Anne Frank”, dirigido por Jon Jones. No papel da garota, a atriz Ellie Kendrick.

Anne Frank, 2001, dir. Robert Dornhelm

     Por fim, até o presente momento, a última película produzida sobre a jovem, é o filme italiano “Memorias de Anne Frank”, dirigido por Alberto Negrin em 2010, contando com a atriz Rosabel Laurenti no papel de Anne Frank.
     Uma série de documentários, filmes para Cinema e TV continuam sendo produzidos sobre Anne. Seria impossível listar todos. A lista, acredito, se atualizará sempre, haja vista que a triste história dessa jovem garotinha continuará sendo apropriada, pois tal história não deve ser nunca esquecida como símbolo do terror humano.

Ass. Rafael Prata
Mestrando em História na Universidade Federal de Sergipe
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