terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Nunca houve uma mulher como Bettie Page.


           Ela é um mito. Mesmo após sua morte. Cultuada até os dias de hoje, “O Anjo Escuro” ou a “Rainha das pin – ups” com certeza deixou sua marca indelével na história recente não só do Cinema, como mais ainda, da fotografia, e porque não dizer, da ruptura do conservadorismo frente à sensualidade e/ou a expressão da beleza feminina.
         Media 1,66m. Tinha como característica marcante sua incomparável franja negra que lhe cobria a testa, oriunda dos seus cabelos lisos e pretos. Não foi a mulher mais bonita de sua época. Certamente foi a mais sensual. Por essência, diga-se de passagem.
         Nascida em Abril de 1923, Bettie explodiu no submundo da fotografia “erótica” em meados dos anos 1950, no auge da sua maturidade física e, sobretudo como mulher. Ao contrário do que se pensa, Bettie foi muito além do que um mero rostinho bonito – e corpo fantástico é claro -; Bettie não deixou de se mostrar como uma mulher de vanguarda, que irrompeu frente ao conservadorismo e a repressão característica de uma sociedade patriarcal e machista naqueles Estados Unidos de outrora – como em outras partes do mundo a época também é claro.

Bettie: No começo de sua carreira.
 
         Filha de uma família conservadora, Bettie desde cedo soube se mostrar uma mulher independente, e que sofrendo desde jovem, as “conseqüências” de ser visivelmente linda, teve que arcar com os “prejuízos” de tal característica. Isso foi marcante em sua trajetória. A Bettie parecia que todos que se aproximavam de si, assim faziam por conta de sua beleza. Não mais que isso. Sua história remonta a um abuso infantil, a um casamento mal sucedido com um jovem, e a um estupro ocorrido ainda em sua adolescência.
         Bettie queria ser atriz. Foi atrás de seus sonhos na antiga Nova York. Para sobreviver, trabalhou como secretária em uma firma enquanto estudava para se tornar atriz. E é claro, seu rosto não passaria despercebido naquela cidade que emulava beleza.
         Em pouco tempo, Bettie começou a participar de sessões de fotografia, onde toda a sua beleza estonteante passou a despontar e a chamar a atenção. Mais do que beleza, Bettie tinha um quê de sensualidade natural, que fazia de suas “caras e bocas” a mais pura expressão da sensualidade. 
          Daí em diante a carreira de Betty decolou. De um policial que nas horas vagas trabalhava como fotografo, surgiu a indicação a Bettie para utilizar sua clássica franja negra frente a sua testa “redondinha”. Nascia ali a caracterização perfeita da mais clássica pin – up da história: Bettie Page.

Bettie e sua franja clássica: sugestão de um policial - fotográfo.

             Sua vida frente às lentes fotográficas demorou menos que 10 anos de apogeu. Assim como acontecia com outras modelos da época, quando o tempo parecia atingi-las, em uma profissão que exigia a extrema beleza juvenil. Bettie nunca conseguiu ser a atriz que desejava. Talvez a fama que obteve frente a sua carreira como modelo sensual, prejudicou seus objetivos. 
            Não importa. Bettie foi o que podia e devia ser. Ela sabia disso. Era seu talento. Provocar. Dissimular.  Bettie provocou uma revolução sexual nos Estados Unidos. É claro que pin – ups existiram antes dela. Mas nenhuma delas conseguiu irromper até os olhares de admiração nas ruas americanas. Era tudo velado, reprimido. Bettie assinava autógrafos. Bettie provocou uma reação da extrema direita americana contra “os desvios de conduta sexuais”.
         Bettie era o cão com rosto de anjo. Uma menina do interior do Tennessie, religiosa, causou alvoroço nos Estados Unidos, influenciando até o meio cinematográfico, com o arquétipo de “mulher sensual e independente” que esta oferecia dali em diante.  

Bettie Page: A Rainha das Pin - ups.
           Traço característico desta influência pode ser visto no grande clássico cinematográfico do diretor Russ Meyer chamado “Faster, Pussycat! Kill! Kill!” do ano de 1965, que reflete intensamente o auge da revolução sexual, da “força bruta feminina”, onde curiosamente, a personagem principal do filme, interpretado pela também bela atriz Tura Satana, apresenta as mesmas características físicas de Bettie. Enfim, uma homenagem no calor da época.

Tura Santana em "Faster": Inspiração em Bettie, as franjas que o digam.
            
          Bettie casou-se três vezes, mas separou-se em todas as ocasiões. Morreu em 2008. No fim de sua vida, havia trazido a tona todo a sua fé, tornando-se uma ativista religiosa, algo que nunca havia abandonado durante seu tempo de apogeu como “pin – up” ao contrário do que se imagina ou se costumava entender. Bettie era bem religiosa. Quando perguntada por um de seus fotógrafos, qual seria a sua reação se Deus estivesse vendo o que ela fazia, Bettie respondeu que agiria naturalmente, pois acreditava que cada pessoa tinha um dom especifico; Deus havia dado a ela o dom da pose, de ser fotografada. O Dom da Sensualidade.
         Bettie, portanto não foi só um rosto bonito, vazio e sem contestação. Foi ponto de ruptura. Ponto de desequilíbrio de uma sociedade marcada pela hipocrisia e pela repressão da sexualidade; Furacão de uma época. Muito além da sua beleza, Bettie retirou a sensualidade por detrás dos panos dos porões sujos de Nova York. Dela em diante, esse aspecto passou a ser valorizado. O Fenômeno das pin – ups, das mulheres fatais passou a ser cultuado e valorizado a partir desse momento. Marilyn Monroe já era famosa na época de Bettie. Certamente sua fama deve muito ao “reforço” dado por Bettie.
         Enfim, felizmente em 2005 foi produzida pela HBO, uma Biografia da mesma, chamada “Notorius Bettie Pagge”. Interpretada de forma magistral por Gretchen Mol – por sinal, nunca vi uma atriz estar tão idêntica a uma pessoa como esta – o filme mostra em 90 minutos a infância, a adolescência – e os “problemas com sua beleza” – até o apogeu artístico de Bettie como a Rainha das Pin – ups, e também o furor causado na época.

Gretchen Moll: Personificação perfeita de Bettie Pagge.

         Vale muito assistir. Para quem gosta de Cinema, para quem curte fotografia, para quem curte cultura vintage, para quem curte pin – ups, para quem procurar compreender a repressão, o conservadorismo, e a sensualidade como rompante em uma sociedade.
         Deve assistir quem é fã de Bettie Page. Nunca houve uma mulher como aquela. Certamente. Uma Franja.

Ass: Rafael Costa Prata
Graduando em História pela Universidade Federal de Sergipe.

6 comentários:

  1. Uma mulher que deve ser lembrada sempre, muito bom o texto meu chapa :D

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  2. Brigadão Hericly! A Idéia da postagem é tentar puxar um pouco o lugar de memória de Page, sem apenas associa-la com a imagem "sensual". O Filme mostra muito bem como ela era inteligente, foi uma mulher frente a sua época e tal; como também as transformações de uma sociedade, o que era tido como vulgar, como "transtorno" e etc. Enfim, Bettie, ainda que sem querer, ajudou a transformar o panorama de uma época; e hoje em dia é claro, virou um ícone cultural. Até quem não há conhece, conhece!

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  3. Mais uma vez meu caro arabéns pelas sábias palavra empreendidas, bom gostei muito do aspecto vanguardista que vc pôs aí, realmente Bette page foi uma mulher muito à frente de sua época, ensaios fotagráficos desse tipo numa época onde os valores "tradicionais" relativos a sexulaidade eram preponderantes, Betti foi sensacional. Lembramos Janio Quadros iria dar ter um derame se Betti fosse brasileira, visto que este proibio o uso de biquines em praias.
    Creio eu , na minha humilde concepção que vemos ainda hoje no cinema essa sua influência das pin-ups, triste do hollywood se essa característica não existisse, às vezes até apelam muito para a sensualidade e acabam esquecendo do conteúdo (momento de frustração). Mas de forma alguma não estou denegrindo o gênero ds pin-ups só acho que atualmente eles apelam muito pra questão "sexy" das heroínas.
    Outro aspecto que gostei muito dela é o fato de ela ser exogena ao seu mundo no quesito da sensualidade, ela faz parte desse mundo tradicionalista reforçado na parte da entrevista, quando ela se mostra uma pessoa meiga e voltada para a religião, o quesito religiosidade forte à época não é abandonado por ela, perceb-se que mesmo ela tendo todos os motivos do mundo para se tornar um membro marginalizado da sociedade devido a todos os problemas por quais teve que passar em sua infância ela não se rendeu. O que me leva a fazer uma reflexão dos dias atuais, qual garota(o) não estaria com o mal do século(depressão) se passase por 20% do que ela passou na infância ????

    Mulher de vanguarda e como característa inerente a isto a força e vontade de vencer sempre esteve ao seu lado.

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  4. Valeu Ádson, brigadão pelo elógio. Então, como afirmei, realmente, na minha humilde opinião, Bettie Pagge foi uma mulher a frente de seu tempo, não só por conta dos ensaios sensuais não, porque se puxarmos para esse viés vai dar espaço para uma representação machista da minha parte, o que não é a intenção. Na verdade, quando afirmei que ela foi vanguarda, foi no sentido de se aventurar, de encarar seus próprios medos e preconceitos de uma sociedade machista, e continuar trilhando seu caminho. Enquanto modelo sensual, nunca deixou de tentar ser atriz, ainda que sofresse preconceitos de todos, e etc. Ela estudou, lia política, ao contrário de "mulheres maçãs" e etc de hoje. Enfim, ela ia além do rosto bonito. Quanto a aparência pin - ups no Cinema, na verdade esse realmente foi um aspecto marcante, mas não necessariamente significava um olhar apenas na sensualidade.. Na verdade, o " ser pin up" em hoolywood não se resume só as modelos e tal.. Mas a própria atitude de " femme fatalle".. Marilyn Monroe foi uma delas por exemplo, e era ótima atriz.. É a questão da essência.. No mais, brigadaço, ótima postagem, e com toda certeza do mundo, Janio Quadros morreria com Bettie Page, de amor, enho certeza!

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  5. Sou suspeita para falar de Bettie e de como adoro a cinebiografia acerca de uma mulher maravilhosa e inteligentíssima. Pena que naqueles tempos, e atrevo-me a dizer que nos nossos também, é difícil conceber que uma mulher bonita e que esbanje sensualidade possa transbordar inteligência e possa mudar tão fortemente panoramas arraigados numa sociedade tão conservadora, e quando alguém reconhece uma moça com essas características, trata como um artigo raro. Há um mês atrás, tive a chance de ler um artigo que exemplificava exatamente isso, mas no caso de Marilyn Monroe, e como ela se sentia presa nesse mundo em que a sua aparência e sua dita "fama" de loira burra e ingênua se sobrepunha de tal forma ao ser humano, que ninguém a imagina sendo uma mulher intelectual e lia livros muito densos( gosto que veio junto do casamento com Arthur Miller) e escrevia notas e poesias que revelavam essa constante luta entre o mito Marilyn e a pessoa Norma, que desejava ser reconhecida como uma mulher mais interessante. Gente se de algum modo dei uma pirada no texto é porque adoro esse assunto, hehehe...

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  6. Aline, você não pirou na resposta não, na verdade concordo em absoluto com você. Com certeza, o caso de Marinlyn reflete muito bem a situação das "femme fatalles" a época. Também li essa reportagem, que se não me engano, virou até um livro com as cartas da mesma. A Dificuldade parece estar justamente nesse ponto: aceitar que junto com a beleza/uso da sensualidade possa existir também o lado intelectual. Daí a surpresa dos contemporâneos de Page, ao perceber que uma moça do interior, belíssima, o que para os olhos conservadores era sinal de que " precisa de mais nada na vida" sabia escrever sobre política, pensava o mundo a sua volta. Enfim, vale a reflexão mesmo, pensar a vida de mulheres deste naipe, desse sentido de vanguarda. Não mitificá-las, mas ao menos entende-las como diferenciadas a época.
    Abração!

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